“Tiago Zanoli
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Em seu leito de morte, o magnata da imprensa norte-americana Charles Foster Kane balbucia uma última palavra: “”Rosebud””. O nome pronunciado pelo protagonista de “”Cidadão Kane”” (1941), filme de Orson Welles considerado uma obra-prima do cinema, desperta a curiosidade dos jornalistas que pretendem documentar a vida do personagem. Após a morte do excêntrico milionário, que nunca hesitou em esbanjar sua fortuna, todos ficam intrigados por ele só pensar em algo chamado Rosebud, ao dar o último suspiro.
Como na ficção, é imenso o interesse das pessoas pelos derradeiros momentos de personalidades que deixaram seus nomes marcados na história. Por fascínio ou mera curiosidade muitos querem conhecer as últimas palavras de grandes líderes, cientistas, artistas e pensadores. O livro “”Talvez Eu Não Tenha Vivido em Vão…””, organizado pelo diretor editorial da Landmark, Fabio Cyrino, apresenta um registro do que disseram algumas figuras célebres.
“”O registro das últimas manifestações proferidas por líderes, reis e estadistas frequentemente é coletado por aqueles que os acompanhavam em suas horas finais, em virtude da notoriedade de suas vidas, e, em alguns casos, essa mesma notoriedade acaba por produzir um efeito curioso, ou seja, a criação de últimas palavras fantasiosas ou que não correspondam precisamente ao que o moribundo realmente expressou em seu último momento””, escreve Cyrino, na introdução do livro.
A fim de evitar equívocos, a obra baseia-se em registros devidamente comprovados por biografias, estudos e trabalhos acadêmicos, “”além de ferramentas eletrônicas de pesquisa que forneçam as devidas fontes e origens de suas declarações””.
Entre os personagens que preenchem as páginas do livro, figuram Sidarta Gautama, Sócrates, Júlio César, Friedrich Nietzsche, Oscar Wilde, Charles Chaplin, Humphrey Bogart, Édith Piaf, Tiradentes, Machado de Assis, Getúlio Vargas, Olavo Bilac e Ruy Barbosa. Todas as frases são acompanhadas de dados biográficos, contexto histórico e curiosidades.
Versões
Muitas das declarações contidas em “”Talvez Eu Não Tenha Vivido em Vão…”” apresentam mais de uma versão – algumas mais aceitas do que outras, embora nunca comprovadas. É o caso das palavras finais de Jesus Cristo, que possui três registros (todos constam dos quatro evangelhos canônicos): “”Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito””; “”Tudo está consumado””; e “”Eloi, Eloi, lamá sabactâni”” (Deus, Deus meu, por que me desamparaste?).
O livro também registra as controvérsias em torno das últimas palavras de Joaquim José da Silva Xavier (1746-1792), o Tiradentes. Há quem diga que, ao subir os degraus da forca, ele teria dito ao carrasco: “”Seja rápido””. Outras fontes indicam: “”Se dez vidas eu tivesse, dez vidas eu daria para salvar a deles!”” – que, na verdade, foram proferidas durante a leitura de sua sentença de condenação. A versão mais aceita é: “”Cumpri minha palavra! Morro pela liberdade!””.
Audácia
Ousado foi o pirata John Rackam (1682-1720), mais conhecido como Calico Jack. Ele e grande parte de sua tripulação foram presos e condenados à morte. Quando o juiz lhe perguntou se tinha algo a dizer antes de ser executado, Jack respondeu: “”Quem você pensa que é? Por acaso você é Deus para ter o direito de decidir o meu destino e de meus homens? Pegue suas palavras pomposas e as enfie no lugar de seu corpo onde o sol jamais bate. Encontro você em outra vida. Adeus””.
O filósofo Voltaire (1694-1778), cujo verdadeiro nome foi François-Marie Arouet, proferiu em seu leito de morte: “”Meu bom homem, esta não é uma boa hora para se fazer inimigos””. A palavras foram ditas quando um padre solicitou-lhe que renegasse o demônio.
Célebres também são as palavras escritas pelo ex-presidente Getúlio Vargas (1882-1954), em sua carta-suicídio: “”Eu vos dei a minha vida, agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história””. Na madrugada de 23 para 24 de agosto de 1954, ele se suicidou com um tiro no coração. A medida extrema foi provocada por uma crise no governo, após uma série de protestos populares liderados pelo jornalista Carlos Lacerda, além da pressão da imprensa e dos militares para que Getúlio renunciasse à presidência.
Já a frase que dá título ao livro, “”Talvez eu não tenha vivido em vão…””, foi dita pelo astrônomo Tycho Brahe (1546-1681), que viveu à época anterior à invenção do telescópio. Suas observações da posição das estrelas e dos planetas alcançaram uma precisão sem igual para o seu tempo, contribuindo para as descobertas posteriores de Johannes Kepler (1571-1630) e Galileu Galilei (1564-1642). Após sofrer de uma grave infecção urinária, que causou o rompimento de sua bexiga, Brahe agonizou durante 11 dias, até morrer, cercado por seus experimentos e seus auxiliares.
“”Nasci em um quarto de hotel e, com os diabos, agora também morro em um!””
Eugene O’Neill
Escritor e dramaturgo
“”Todas as grandes bobagens que você faz na vida, nesta vida é que pagamos””
Édith Piaf
Cantora e atriz
“”Eu nunca deveria ter trocado o scotch por martinis””
Humphrey Bogart
Ator
“”O gosto da morte está sobre os meus lábios… Sinto o gosto de algo que não é deste mundo””
Wolfgang Amadeus Mozart
Compositor
“”Se realmente existe um Deus vivo, sou o mais miserável dos homens””
Friedrich Nietzsche
Filósofo
Confira
Fabio Cyrino (org.)
Talvez Eu Não Tenha Vivido em Vão…
Landmark 240 páginas
Quanto: R$ 34, em média
“JORNAL GAZETA DE VITÓRIA