“Carlos Augusto Viana, Editor
Nascido na Irlanda (Dublin), na segunda metade do século XIX, Oscar Wilde, na Inglaterra vitoriana, conviveu com as maiores expressões daquele prolífero momento da cultura inglesa, sendo reconhecido, por grandes figura daquela época, como uma voz ímpar, singular, de incontestável genialidade, sendo a figura central de movimento esteticista, que reunia, além de escritores, artistas plásticos, num tom de vanguarda.
A Editora Landmark lança, agora, em edição bilíngue (Inglês / Português), em dois volumes, as nove peças com compõem a obra completa de Oscar Wilde no gênero dramática.
Mesmo sendo um romancista virtuoso, com narrativas de brilho próprio, com marcas personalíssimas, seu sucesso literário, ainda em vida, decorreu, exatamente, das polêmicas que suas peças sempre despertavam no público, por conta da refinada ironia, da crônica dos costumes, da lâmina posta sobre a ferida da hipocrisia.
Além disso, utilizava-se de seus dramas teatrais para, através deles, apresentar aos contemporâneos suas crenças estéticas: era, sobretudo, adepto da ideia de a beleza salvaria o mundo; inclusive, ele próprio, Oscar Wilde, na maneira de viver, cultiva a polidez do comportamento, bem como costumava cercar-se de tudo o que exprimisse uma experiência de gozo estético.
Sem favor, Oscar Wilde é posto ao lado dos grandes dramaturgos de seu tempo, tais como Ibsen; ressalte-se, também, o fato de que, ao conhecer bem os valores e as ânsias por se guiavam os que viviam na Inglaterra vitoriana, ele sempre punha nos enredos a problemática que movia a atenção do público de então, o que implica sucesso garantido nos teatros em que eram encenadas.
Há, no prefácio da obra, uma observação pertinente, segundo a qual, em suas peças, Oscar Wilde “”invoca em si mesmo e ao mesmo tempo uma reação e uma frustração do público: as situações dramáticas e satíricas são invocadas, apresentadas e completamente alteradas em seus desfechos, ferramentas utilizadas por Wilde, como um manipulador de situações””; com tal expediente, fazia surgir um espaço com o qual o público se reconhecia no tempo e no espaço.
No primeiro volume, duas peças são intrigantes: “”A Duquesa de Pádua””; e “”A importância de ser constante””. A primeira se sedimenta em elementos-chave para um bom espelho da condição humana: o assassinato de um nobre deixa órfão o único filho; este, por sua vez, tem a fortuna usurpada pelos traidores de seu pai; na juventude, o segredo de seu nascimento é desvendado; surge a possibilidade da vingança, mas a paixão por uma duquesa parece ser o entrave de tudo: “”Eu não vou lhe dar nenhum detalhe sobre a sua vida. Só lhe digo uma coisa: Mrs. Erlynne já foi honrada, amada, respeitada. É bem-nascida, tinha posição – e perdeu tudo – jogou fora, se quiser. Isso torna tudo mais amargo””. O final da trama é surpreendente.
Em “”A importância em ser constante””, imprime-se a comédia de costumes: o tema se concentra na exigência social de cada um, utilizando-se de uma máscara, falsificar a identidade, para, desse modo, livrar-se do olho da opinião pública. O protagonista, Jack, é um homem solteiro, cansado das obrigações da vida em sociedade; assim, cria um irmão fictício e, assumindo-se a identidade, pode, sem temores, cometer transgressões e imprudências, sem o medo de qualquer punição de ordem moral ou social. Jack pode, assim, destilar inúmeros juízos de valor, tais como: “”Sua vaidade é ridícula, sua conduta é ultrajante, e sua presença no meu jardim é inteiramente absurda. Portanto, vai pegar o trem das quatro e cinco, e espero que faça uma boa viagem de volta a Londres””.
No segundo volume, estão cinco peças: “”Salomé”” – inspirada na narrativa bíblica do Novo Testamento -; “”Uma mulher sem importância”” , cujo motivo recai sobre as escolhas sociais, como imposição dos valores de determinadas épocas; “”Um marido ideal”” , centrada, agora, nos temas da chantagem e da corrupção política, com direito a cartas comprometedoras; “”Uma tragédia florentina””, texto inacabado sobre a relação ilícita entre um príncipe e uma plebeia, com notas de humor; e, por fim, “”A santa cortesã””, sobre a fronteira que separa o pecado e a virtude.
Mesmo sendo uma pela inacabada, “”A santa cortesã”” é um exemplo preciso da ironia e do humor de Oscar Wilde; a linguagem apresenta o ritmo e o tom poético dos “”Cânticos dos Cânticos””: “”Quem é ela? Ela me dá medo. Usa um manto de púrpura, e seus cabelos parecem fios de ouro””. A leitura do teatro completo de Oscar Wilde nos põe diante de criador inquieto, além de seu tempo.”
DIÁRIO DO NORDESTE (CE)