“À moda de Oscar Wilde

Landmark lança no Brasil uma edição bilíngue da versão original datilografada de O Retrato de Dorian Gray

Oscar Wilde escreveu, em 46 anos, diversos contos, peças e poesias, conquistando fama e sucesso na Londres da era vitoriana. Mas, o único romance desse escritor nascido em Dublin, na Irlanda, em 1854, é, de longe, o maior trunfo de sua carreira. O Retrato de Dorian Gray não é apenas um clássico ainda atual, mas uma obra-prima que polemizou e mostrou seu valor já na sua época. O escritor levantou um comportamento até então inimaginável e chocante na dualidade do personagem principal, um homem hedonista e conservador que tranquilamente frequentava encontros da alta sociedade inglesa após cometer inúmeros crimes e assassinatos.

Ou seja, a sujeira escondida por aqueles que andam ao seu lado pode ser muito mais carregada do que até os mais pessimistas possam imaginar. E aceitar isso não é uma tarefa fácil, principalmente em uma aristocracia conservadora. Ou, como o autor chama no livro, “a terra natal da hipocrisia”. A versão da obra mais conhecida pelo público é lançada pela War, Lock and Company em abril de 1891, quando Oscar Wilde reviveu, alterou e ampliou a edição publicada no periódico norte-americano Lippincott’s Monthly Magazine, em 20 de junho de 1890. A editora inglesa exigiu diversas alterações no texto para lança-lo no mercado britânico, exatamente por trazer um conteúdo polêmico demais para a época. Mas é a versão original que a Editora Landmark (244 págs., R$ 35,00) acaba de relançar em uma edição bilíngue (inglês/português) – e comentada com os capítulos originais publicados pela revista. Uma cópia fiel à primeira versão datilografada e emendada à mão pelo escritor irlandês em 1890, consideravelmente menor, pois tem apenas 13 capítulos, sete a menos do que o texto amplamente divulgado.

Entre as mudanças nas versões, a original mostra uma trama mais elaborada, como uma influência negativa muito mais marcante de lorde Henry e, consequentemente, o relacionamento de Gray com os demais personagens não é tão suavizado. No enredo, Dorian Gray é um belo e ingênuo rapaz retratado pelo artista Basil Hallward em uma pintura. Na verdade, ele é a inspiração de Basil mas, devido ao fato de todo seu íntimo estar exposto na obra, ele não divulga a pintura e decide presentear o retratado com o quadro. Com a convivência de lorde Henry Wotton, um cínico e hedonista aristocrata muito amigo de Basil, Dorian Gray é seduzido ao mundo da beleza e dos prazeres imediatos e irresponsáveis, espírito que foi intensificado após, finalmente, conferir seu retrato pronto e apaixonar-se por si mesmo.

O livro tem apelo atemporal e universal, e sua trama se vale de alguns traços que notabilizaram a literatura da época. Entre as características mais fortes, há a presença de elementos fantásticos e de grandes reflexões filosóficas, além do sarcasmo implacável de Wilde.

Debate

O Retrato de Dorian Gray provocou um intenso debate sobre o papel da arte em relação à moralidade, mesmo após o lançamento da edição de 1891. Tanto que que, anos mais tarde, o livro foi usado contra o autor em processos judiciais, como evidencia de que ele possuía “uma certa tendência” ao homossexualismo, motivo pelo qual acabou condenado a dois anos de prisão por atentado ao pudor. O fato é que, no ano em que se comemora os 160 anos de nascimento de Oscar Wilde, a obra continua sendo estudada e uma referência para inúmeros escritores. “JORNAL CORREIO POPULAR, CAMPINAS (SP)