“Sementes da boa literatura

Por Benedito Veloso

Com os preços mais acessíveis da indústria gráfica, graças à editoração eletrônica e outras vantagens modernas, publicar um livro hoje ficou mais fácil, desde que o autor pague a conta. Isto por si só não desmerece nenhuma produção independente. Pelo contrário, abrevia o caminho dos novos escritores e promove mais rapidamente o contato do primeiro livro com o leitor. Também, evita o trabalho desgastante de tentar convencer uma editora a ela arcar com os custos, bem como permite ao novato escrever o que bem entende sem o crivo de um implacável conselho editorial que geralmente rechaça a maioria das tentativas.

Entretanto, quando o trabalho do iniciante consegue provocar aquele “estalo” que provoca de imediato o interesse do editor mais durão, é sinal de que o livro promete. Uma vitória. E se isto acontece e, de lambujem, o conselho editorial não mexe uma vírgula do texto, aí, então, é o máximo! Esta glória foi atingida pelo novato Celso Abrahão, um dos mais jovens escritores jacareienses, cujo primeiro livro, o romance ‘Sementes da Razão’, acaba de germinar forte e promissor do prelo da Editora Landmark, de São Paulo. Ambos, editora e autor, não se conheciam. O trabalho, fruto de minuciosa pesquisa histórica e arquitetônica, foi reconhecido e cumprimentado pelo editor que, de quebra, elogiou o estilo da escrita e a composição dos diálogos. Que mais um estreante poderia desejar?

Vocação tardia, Celso Abrahão concebeu a obra cerca de cinco anos atrás, quando na primeira viagem a Paris foi visitar a catedral de Notre-Dame de Reims. Até então era devorador de livros de época e admirador interessado da arquitetura. Só. A grandiosidade do que viu, entretanto, despertou no extasiado turista brasileiro a vontade de escrever sobre o que havia por detrás de tudo aquilo. Foi o ponto de partida para a aventura que viveu nos dois anos seguintes juntamente com seus personagens, nos remotos séculos XII e XII da Idade Média, dos anos 1286 a 1315, época da edificação das grandes catedrais.

O ambiente de então, marcado pela linguagem da macro arquitetura das catedrais, teve a incumbência maior de transmitir às gerações futuras as convicções religiosas acompanhadas de seus rituais, usos, costumes e cotidiano por meios de pedras e formas que compunham a arte da construção. Como ler era um privilégio de poucos, foi preciso outra linguagem para perpetuar tudo o que se julgou necessário numa transmissão de ideia de poderio, domínio e proteção de um grupo sobre a massa da população submissa. “Está tudo ali, naquelas obras gigantescas”, comenta o autor ainda impressionado, sem deixar de apontar para o “filho” que “saiu com a cara do pai”, afirma.

Desde a sobrecapa à última capa, passando pela tipologia usada no texto, ‘Sementes da Razão’ transmite-nos o clima medieval, cenário do enredo. Os personagens, Elion, Thomas, Petit e Gustav, representam “os arquitetos, escultores, pedreiros e clérigos que, anonimamente fizeram de catedrais como a Notre-Dame de Reims um marco intransponível na escalada da genialidade humana,” escreve o autor. Com uma história bem estruturada, rica em mistérios e simbolismos provocados pela densidade da era medieval, Celso Abrahão transporta-nos, com a ajuda de seus personagens, para um fascinante mundo de aventuras e mistérios que simbolicamente tem muito a ver com os dias atuais. Mostra-nos, didaticamente, o quanto devemos aos anônimos pedreiros livres precursores do trabalho solidário e da valorização profissional que tirou o mundo do obscurantismo e mudou a história. Imperdível esse trabalho do Filho Brilhante Celso Abrahão que consolida a vocação do jacareiense para a literatura. “JORNAL DIÁRIO DE JACAREÍ